Paulo Leandro Leal
A sociedade brasileira tem a mania de transformar tudo em uma velha luta entre o bem e o mal. Um ardil psicológico, fundado em convenções provisórias, superficiais, criadas de improviso pela mídia e pelo senso comum, que levam à execração do público umas tantas coisas das quais é bom falar mal, seja lá o que sejam. Essa condenação forma um lugar-comum no qual as pessoas se reúnem para sentir-se bem mediante discursos contra o mal.
É o caso da construção da usinas hidrelétricas. O sujeito não sabe bem o que é nem como funciona, mas viu de relance, num jornal ou num blog qualquer, que é coisa ruim. É coisa de má reputação. Falando contra ela, o cidadão sente-se igual a todo mundo, e rompe por instantes o isolamento que o humilha. Criam-se assim dois grupos: o dos bonzinhos, que são contra as hidrelétricas e apenas defendem o meio ambiente, os índios, os pescadores, etc; e os maus, que são a favor das usinas para o lucro das grandes construtoras e a destruição do meio ambiente.
É neste ambiente hostil ao debate e ao exercício da lógica que se trava mais uma guerra midiática, desta vez envolvendo a intenção do governo brasileiro de construir um complexo de usinas na bacia do Tapajós. As pessoas são bombardeadas diariamente com diversas informações superficiais ou até mesmo fictícias sobre o assunto, criando-se um caldo de cultura que leva a concluir que, para estar do lado do bem, só mesmo se opondo a um projeto que veio para destruir o bioma e o modo de vida de populações tradicionais. Um discurso pronto e velho, mas que serve muito bem à demonização e à transformação do debate numa espécie de novela das nove, onde vilões e mocinhos encontram o seu lugar no consciente coletivo.
Enquanto os contrários e os favoráveis travam uma batalha de acusações e uma guerra de informações, a realidade vai se impondo na forma da execução do projeto em si. De repente, quando tudo acaba, percebe-se que nada aconteceu. Nem as previsões catastróficas se concretizaram nem os cenários lindos e belos traçados se consumaram. Mas todos ficam satisfeitos: os partidários do não, mesmo derrotados, sentem-se superiores por estarem do lado de uma boa causa; e os partidários do sim se contentam em verem de pé aquilo que imaginam ser a sua tábua de salvação.
No meio desse mar de obscurantismo fica a ausência de idéias, projetos e ações que possam sair do lugar comum. A sociedade se divide e não busca uma discussão séria e aprofundada que traga soluções para os seus problemas. Muito mais produtivo que dizer “sim” ou “não” seria perguntar “como”. Afinal, se é fato que existe uma oportunidade criada com os bilionários investimentos previstos neste tipo de empreendimento, também é fato de que estes recursos podem simplesmente escoarem para fins diversos que não a melhoria da qualidade de vida da população regional.
É preciso ir além do lugar-comum e buscar garantias para que um projeto de tal magnitude não passe de mais um ícone de uma espécie de colonialismo que não pode mais encontrar espaço em nossa sociedade. Servir ao Brasil nossos recursos naturais deve ser não somente uma obrigação como parte integrante da Pátria, mas também motivo para que as gerações do futuro possam se equalizar em igualdade de condições àqueles aos quais servimos agora. Não será justa a imposição da necessidade nacional sem que sejam atendidos os velhos anseios de um povo que há décadas vive e se sente como se não fosse parte da Nação, como se direitos não tivesse e como se estivesse sido jogado no meio da selva, num experimento governamental que não deu certo.
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