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20 de mai. de 2014

Sem alarde, Amaggi acelera crescimento

"Vocês falam de ABCD pra cá, ABCD pra lá. Mas devia ser AABCD. Vai lá ver o que esse pessoal anda fazendo". O produtor do Centro-Oeste, que prefere não ser identificado, refere-se ao quarteto mais poderoso hoje no agronegócio - ADM, Bunge, Cargill e Louis Dreyfus, líderes do comércio global de grãos que dão nome a sigla. O outro "A" que ele sugere é de Amaggi.

A comparação é intrigante, mas exagerada. Entre as quatro multinacionais centenárias - três americanas e uma francesa - e a empresa da família do senador Blairo Maggi (PR/MT), ainda há alguns bilhões de dólares de faturamento e milhões de toneladas de soja comercializados de desvantagem. Mas denota uma estratégia discreta e contínua de expansão do grupo rumo a novos mercados, que não passa despercebida a quem é do campo e está no negócio rural.

Criada há 37 anos no Paraná e consolidada no Mato Grosso, a Amaggi vem gradativamente ganhando musculatura no mercado de grãos. Nos últimos três anos, investiu R$ 1 bilhão em logística, estruturas para originação, beneficiamento e aquisição de terras, o que contribuiu para que abocanhasse 17% de participação de mercado no Mato Grosso (maior produtor de grãos nacional) e levasse a empresa à 18ª posição no ranking de maiores exportadores do Brasil, com embarques de US$ 1,7 bilhão em 2013, segundo a Secretaria de Comércio Exterior.

Sem fazer alarde, a Amaggi inaugurou em fevereiro deste ano um escritório de comercialização no Paraguai, o quinto fora do país - a companhia já atua na Holanda, Suíça, Noruega e Argentina.

"Somos uma empresa local, mas não uma empresa conformada", afirma Waldemir Ival Loto, que assumiu a presidência do grupo há dois anos em meio ao rearranjo organizacional no alto escalão que praticamente coincidiu com a transferência da sede de Rondonópolis a Cuiabá.

O sinal mais recente dessa reestruturação veio à tona no mês passado. Após três décadas, o Grupo André Maggi decidiu simplificar e mudar a marca para Amaggi, alteração estendida às quatro unidades de negócios do grupo - agora Amaggi Commodities (trading), Amaggi Agro (plantio), Amaggi Navegação e Amaggi Energia.

"Era uma mudança estudada há muito tempo e motivada, principalmente, pelo crescimento e internacionalização da companhia. Com isso, veio a necessidade de uma padronização das áreas de negócios", diz o executivo. A escolha levou em conta não só o nome da divisão mais importante - a Amaggi Exportação e Importação, responsável por 80% do faturamento de US$ 5 bilhões em 2013 -, mas a facilidade de pronúncia para clientes que não falam português. Segundo os números mais recentes, as operações da Amaggi no exterior movimentaram quase a metade das 9 milhões de toneladas de grãos do total comercializado pelo grupo no ano passado.

Confortável na sala da presidência que dá vista para o Centro Novo de Cuiabá, a parte mais nobre e em franca expansão da capital mato-grossense, Loto tem diante de si as bandeiras dos cinco países onde a empresa está. Mas a internacionalização não tirou o olhar desconfiado e a fala cautelosa desse paranaense de 59 anos, 28 deles ao lado dos Maggi. "É preciso citar mesmo isso?", ele questiona. "Não quero aparecer dizendo que vamos crescer tanto ou investir naquilo. Não queremos parecer arrogantes. A gente faz as coisas no nosso estilo".

Só bem mais tarde vem a resposta formal, por e-mail. "A Amaggi pretende investir até 2020 outros R$ 1,5 bilhão, no Brasil e exterior".

Embora o Brasil continue sendo o foco principal e os desafios ainda sejam consideráveis - ganhos de produtividade, combate a pragas, mudanças do clima -, Loto afirma que, para crescer, é preciso estar nos grandes mercados. Mais precisamente, em mercados que produzam de 80 milhões de toneladas de grãos por ano para cima. Nesse sentido, a Amaggi pretende dar prosseguimento à estratégia de expansão de escritórios no exterior iniciada em 2008 e, talvez, até beneficiamento. "Estudamos oportunidades de estar e crescer nesses mercados, seja por aquisição ou de forma orgânica. Hoje não temos nenhuma empresa no radar, mas respondemos rápido a oportunidades. Até 2020 queremos estar nos Estados Unidos e na Ásia".

O caminho da internacionalização passa necessariamente pela originação de grãos, possivelmente pela industrialização e a uma distância cuidadosa do plantio. A experiência na Argentina mostrou que a decisão tem riscos embutidos. Com o plantio de 5 mil hectares iniciado em 2011 e planos de chegar a 30 mil hectares em cinco anos, a Amaggi desistiu do negócio no país vizinho por não ter o retorno esperado. "A adaptação ao modelo argentino foi difícil. Um terço é retido pelo governo, um terço vai para o arrendamento da terra e um terço para produzir. As margens não são boas", diz Loto.

A empresa se voltou à comercialização de soja, milho e trigo naquele país. "Não podemos sair da Argentina. Estamos falando de 54 milhões de toneladas de soja [previsão da produção do país para a safra atual]. É preciso estar lá, independentemente de governo ou do que for", afirma.

Na safra passada, a 2012/13, o Brasil representou 72,1% dos grãos comercializados pela Amaggi. A Argentina ficou com 15,2%, e os demais escritórios pulverizaram o volume restante negociado.

Apesar das previsões de redução nas margens de comercialização de grãos na safra 2013/14, pressionadas pelos preços mais baixos e custos mais altos de produção, a Amaggi - assim como os demais "players" desse mercado - aposta na compensação pelo crescimento do volume originado. Entre as três últimas safras, as de 2010/11 e de 2012/13, a originação de soja pela Amaggi no Brasil subiu de 3,70 milhões para 3,94 milhões de toneladas. A tendência é superar a marca no exercício atual, mas a empresa prefere ainda não abrir números.

Sem citar estimativas, Loto diz que a empresa prevê crescer junto com o avanço agrícola esperado para o Centro-Oeste, que deve ganhar fôlego com o aumento de produtividade, novas áreas e os canais de escoamento pelo Norte do país. A companhia já está posicionada na região, com terminais fluviais em Porto Velho (RO), Itacoatiara (AM) e Itaqui (MA). Dentro dos investimentos anunciados, construirá mais dois para alavancar o embarque de grãos pelo rio Madeira de três milhões de toneladas/ano para cinco milhões/ano.

A saída pelo Norte do país está por trás também de duas parcerias estratégicas do grupo: as joint ventures com Bunge e Dreyfus, que permitirão diminuir custos e dar escala a ambições de projetos comuns. Com a Bunge, a Amaggi criou no fim do ano passado a Unitapajós, responsável pelo escoamento fluvial de parte da safra de grãos do Centro-Oeste pelo corredor Tapajós-Amazonas. O transporte será inicialmente feito com frota de 50 barcaças e dois empurradores. Em 2015, com a incorporação de mais 40 barcaças e um empurrador, deverá atingir a capacidade plena de quatro milhões de toneladas de grãos por ano.

No caso da Dreyfus, a Amaggi atuará no Terminal de Grãos do Maranhão (Tegram), no Porto de Itaqui. O terminal terá capacidade de movimentar 1,25 milhão de toneladas de grãos por ano e atenderá a expansão prevista da produção na região denominada "Matopiba" (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). A expectativa é que o terminal comece a operar nos próximos meses - a Amaggi também aguarda a liberação de licenças.

"Hoje a gente está mais preparado para fazer parcerias. Apesar de sermos uma empresa familiar, a gente tem aprendido [a negociar com a concorrência]", diz Loto.

Do primeiro bilhão faturado em dólares, em 2007, para os cinco bilhões de dólares de 2013, o grupo virou nome de avenida, do principal terminal de ônibus de Cuiabá (ainda com o nome antigo) e é frequentemente homenageado pelo empreendedorismo no Estado. Rosto mais conhecido da família, Blairo também foi alvo de saudações, mas negativas. Recebeu em 2005 o "Prêmio Motosserra do Ano", atribuído por ambientalistas do Greenpeace aos desmatadores campeões da Amazônia. Ele era governador do Mato Grosso, e o Estado entrava no radar mundial.

Veio a moratória da soja - um arranjo entre indústria, produtores e sociedade civil de tolerância zero ao desmate - e a ajuda do tombo nas cotações da soja. O desmatamento da floresta arrefeceu.

Já quase saindo da sala, ao fim da entrevista, Loto prefere não comentar o assunto, que diz estar no âmbito da Abiove, a associação que representa o setor. Mas lembra que o momento mudou. "Há hoje uma governança que não havia naquela época", diz. "Não podemos proibir produtores de desmatar o que lhes é de direito para plantar".

Citada no ano passado pela Forbes como uma das 15 famílias mais ricas do Brasil, os Maggi estão hoje restritos ao conselho do grupo. Itamar Locks, casado com uma das quatro irmãs de Blairo, foi último da família a deixar a empresa, no ano passado.

Nos corredores compridos da sede, funcionários gostam de citar a frase que Blairo disse recentemente em Cuiabá. "Antes", teria dito ele, "Mato Grosso estava distante de São Paulo. Agora São Paulo é que está longe de Mato Grosso".

Fonte: Valor Econômico

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